Dice Sitoe pede perdão a Afonso Dhlakama: “Era herói, só descobri após a sua morte”
Durante anos, o sistema de ensino moçambicano difundiu uma narrativa que apresentava Afonso Dhlakama, líder da oposição e presidente do partido RENAMO, como um “terrorista” responsável por inúmeras mortes. Essa visão moldou uma geração, especialmente os nascidos na década de 1990, que cresceram com uma percepção negativa do político. Contudo, após a sua morte, parte da população começou a revisitar essa narrativa e a reconhecer um outro lado da história, especialmente em meio da situação político actual, no qual o partido PODEMOS ultrapassou a RENAMO como a segunda força política mais votada nas eleições de 9 de outubro.
A figura de Afonso Dhlakama, que durante sua vida foi alvo de críticas e desconfiança, ganhou contornos de resistência e heroísmo na memória de muitos moçambicanos. A sua morte, em 2018, deixou um vazio que, para alguns, revelou-se maior do que apenas a ausência de um líder político. Eventos recentes, incluindo os protestos que sucederam as eleições de outubro, levantaram questões como repressão policial e o uso de força letal, com relatos de mais de 100 mortes. Esses episódios intensificaram reflexões sobre o legado de Dhlakama e o papel das instituições públicas na perpetuação de narrativas históricas.
Nesse contexto, o rapper moçambicano Dice Sitoe lançou, esta quinta-feira (26/12), a sua nova música intitulada “Desculpa, Afonso Dhlakama”, disponível no YouTube. A obra surge como uma espécie de mea-culpa em nome de uma geração que, segundo o artista, foi manipulada a odiar o líder da RENAMO.
Na letra da música, Dice lança um pedido de desculpas sincero e uma reflexão crítica:
“Peço desculpas, Afonso Dhlakama, por nós, falo em nome de todo o povo. Ele era herói, infelizmente só descobri depois de morto. Eras nacionalista. Diga a Matsangaíssa que fomos todos esses anos aldrabados. Quando entoava o hino nacional, sempre fui ensinado, assim como todo o mundo, a não dar ouvidos a líderes como tu.”
O rapper destaca ainda os acontecimentos recentes que o levaram a mudar de perspectiva:
“23 de dezembro só vejo lume nas redes sociais. Agora percebo porque é que você era rude às vezes. Mudamos de ritmo, agora estamos a dar novos passos. Não querem aceitar que já não aceitamos dançar a música deles. Dhlakama, não vou mentir: eu te odiava. É que a informação sobre ti era toda ela manipulada. Hoje vi, por isso vou pedir: peço desculpas, Afonso Dhlakama, por nós. Eu falo em nome do povo.”
A música de Dice não é apenas um pedido de perdão, mas também um manifesto que aborda o sentimento de muitos moçambicanos num período de incertezas políticas e sociais. A música reflecte e a busca por uma reavaliação do passado e por respostas sobre o futuro da nação.

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